quem ama é como quem vê

Encontrar Jesus,
ser visto de novo por Jesus – na expressão de João -,
apresenta-se associado a um parto,
ao aparecimento se “algo” muito maior
que faz esquecer o próprio sofrimento,
que faz medir em outra escala,
e que trás uma alegria que já ninguém tira,
que já não depende de mil e uma coisas…

Encontro, ser olhado, ser visto,
e alegria, “a-lacrem” – que, bem sabemos, significa muito mais do que “sem-lágrimas”.
Sim, a alegria é da ordem da relação, ou se quiséssemos, a relação enxuga as lágrimas,
o verdadeiro encontro enxuga as lágrimas.
E se a relação é a linguagem da fé [“amen”, firmar, amarrar, “criar laços”]
a alegria é consequência dos laços, da relação, da fé.

No episódio de Paulo no tribunal de Corinto
percebemos um movimento de busca de culpados,
usando o próprio chefe da sinagoga;
ninguém queria, verdadeiramente, ver ninguém;
ninguém queria, verdadeiramente, encontrar ninguém;
ninguém queria, verdadeiramente, relação;
buscavam-se culpados
– como em tantas manchetes e noticiários;
como em tantos dos nossos lamentos…

Hoje não queremos culpados;
hoje queremos “ser visto” por Jesus;
hoje queremos olhar o outro como se fosse o próprio Jesus a olhar,
como se fosse o próprio Jesus a ver,
como se fosse o próprio Jesus a perdoar,
dizendo ao outro o que Jesus nos diz a nós, como a Paulo:
“Não tenhas medo. Fala, porque eu estou contigo e ninguém te fará mal”.

o ensaio já começou

Nos textos servidos para o dia de hoje,
assistimos a inseguranças, a incertezas
de tempos, de espaços, de relações.

Lucas apresenta Paulo a criar uma rota de cidades
e a redefinir os seus interlocutores – cada vez mais improváveis.
João apresenta três vezes o mesmo enigma indecifrável,
entre ver Jesus, a sua ausência e a visão definitiva,
sugerindo nesse tempo de ausência, de busca,
ambiguidades entre tristeza, gozo e alegria.

É neste estado que o cristianismo das origens nos é apresentado:
gente e quotidianos de busca, de construção;
gente improvável que se revelam cuidadores,
espaços inesperados onde se lançam pontes entre semelhantes.

É esta a Páscoa que faz sentido ensaiarmos a cada passo
até sermos um.